Às vezes, do nada, o céu fica negro e se enche de nuvens densas e escuras. O silêncio que chega a estremecer o coração faz o ar tenso e anuncia-se a tempestade. Não demora muito e vêem-se os relâmpagos claros iluminando o céu.
A pouco e pouco ela se aproxima e ao fundo ouvem-se os trovões, como num coro de música. Se fechar os olhos consigo encaixar perfeitamente uma melodia de uma tragédia clássica.
O quadro é perfeito: a montanha, o lago, a chuva. Gotas gordas caem pesadamente e o vento levanta o pouco de terra que ainda não virou lama.
É a terceira vez que cai uma tempestade dessas desde que estou em Pokhara. Mas a tensão que se sente quando algo de errado está para acontecer me acompanha desde o momento em que cruzei a fronteira da Índia com o Nepal. Uma certa calma inquieta no ar e nas pessoas, reflete a situação política atual do país.
É a terceira vez que cai uma tempestade dessas desde que estou em Pokhara. Mas a tensão que se sente quando algo de errado está para acontecer me acompanha desde o momento em que cruzei a fronteira da Índia com o Nepal. Uma certa calma inquieta no ar e nas pessoas, reflete a situação política atual do país.
Entender o que está acontecendo não é fácil. As informações da maioria das conversas com os nativos são um tanto confusas se não mesmo contraditórias.
Em 2001, o rei Birenda e quase todos os membros da família real foram assassinados, supostamente pelo príncipe herdeiro, Dipendra, que se suicidou. Na sequência o irmão do rei, Gyanendra assumiu o poder e manteve uma monarquia constitucional até 2008, com uma crescente insatisfação popular com o seu autoritarismo. Após acordo entre partidos políticos e fações guerrilheiras rebeldes, o Nepal tornou-se uma república parlamentarista em 2008.
Desde os anos 90 que os Maoistas aumentam o seu poder, com pequenas insurgências militares e com filosofia de guerrilha, leninismo e maoismo. Atualmente o primeiro-ministro é o líder dessa luta de anos, Prachanda.
No dia 04 de Maio, Prachanda tentou demitir o chefe do exército, Rookmangud Katawal, mas este se recusou a deixar o cargo.
A última semana foi marcada por constantes manifestações tanto aqui em Pokhara, como em Katmandu.
A atmosfera está calma, mas há qualquer coisa no ar que torna esse silêncio turbulento, como aquele que antecipa a tempestade.
Nos últimos meses tem havido mais cortes de energia que os últimos registrados. As pessoas ficam em casa, isoladas, sem comunicação, sem televisão, sem informação.. O custo de vida para os turistas aumentou desde o último ano. A mudança do valor do visto e a valorização do dollar apontam para uma maior presença dos EUA no país. O timing não poderia ser mais perfeito: a instabilidade política, social, cultual, o tal silêncio turbulento.
Cada vez mais me convenço que coincidências não existem e gostava de tentar entender mais porquês. É certo que a China é aqui ao lado....
Mas é isso, por enquanto tento entender porquê sinto essa tensão no ar, este céu pesado. Pode ser que seja só o fato de as monções estarem a se aproximar. Ou pode ser que algo esteja para acontecer... só o tempo dirá.
Pokhara - Nepal 2009
Pokhara - Nepal 2009
2014 - atualização
Prachanda demitiu o chefe do exército a 03 de Maio de 2009. Isso levou a uma vaga de manifestações por todo o Nepal.
Pouco tempo depois, o então presidente, Ram Baran Yadav, vetou a decisão de Prachanda e recolocou Katawal no cargo de chefe do exército. Em resposta a isso, Prachanda resignou o seu cargo de Primeiro-Ministro, alegando que esta decisão seria para manter a paz, que estava fragilmente em vigor desde 2006. O governo nepalês entrou em colapso.
Em 2012 finalmente os Estados Unidos anunciaram que removeram formalmente o governo do Nepal (UCPN-M) da sua lista de "grupos terroristas globais". Ainda assim a conjuntura política do Nepal continua incerta e os interesses tanto da China, da Índia como dos EUA continuam por se esclarecer.